logo50mini

DETALHES DA TURMA

Seminário de Cultura e Sociedade Moderna I

Nome da Disciplina: Seminário de Cultura e Sociedade Moderna I
Carga Horária: 90
Créditos: 4
Obrigatória: Não
EMENTA
Este curso se volta para a análise das controvérsias intelectuais acerca da natureza moral da escravidão africana, no mundo ibero-americano, entre a segunda metade do século XVII e a segunda metade do XVIII. Frequentemente analisada como fenômeno econômico e social, a escravização dos etíopes pode ser também compreendida a partir dos debates teológico- políticos, centrais para o governo das colônias, que emergiram como tópico essencial para a razão de estado ibérica na expansão ultramarina. Nas últimas décadas, em diferentes frentes de pesquisa, investigadores têm procurado reavaliar a profunda marca cristã na origem dos sistemas normativos do Ocidente contemporâneo. Trata-se de um movimento importante de reconstituição intelectual que tem possibilitado também ultrapassar visões duais e institucionalizantes, supondo fronteiras claras entre o Estado – domínio da razão secular, de caráter essencialmente político – e a Igreja – domínio do sentimento religioso, de caráter essencialmente apolítico. Esse esforço de compreensão propõe não apenas chamar a atenção para a natureza multidimensional e simbiótica do vocabulário do poder na história das sociedades ocidentais, como também demonstrar em que termos o saber teológico é parte constitutiva da longa trajetória da racionalidade que organiza os sistemas jurídicos, éticos, políticos e econômicos. Sendo assim, este curso centra forças na compreensão do papel histórico da Segunda Escolástica como paradigma epistêmico que incidiu também sobre o repertório explicativo da escravidão, uma condição jurídico-canônica de máxima dependência a ser justificada à luz da razão natural. Trata-se de estabelecer itinerários conceituais a respeito das explicações político-religiosas que fundamentaram a justiça do tráfico negreiro e a incorporação diminuída dos africanos nas comunidades ibero-americanas. Esse vocabulário modulava o exercício da política e tendeu à progressiva secularização a partir de meados do século XVII, quando, diante da reforma do probabilismo escolástico, é possível observar o maior volume de leis positivas que procuravam mediar a costumeira violência em relação aos africanos. O reconhecimento de direitos naturais eram políticos por definição, tendo em vista que eles definiam a consciência e os espaços legítimos de ação, explicavam e justificavam a ordem “natural” da política e das coisas, definiam a adoção de procedimentos legais. Pretende-se, portanto, investigar as bases históricas do léxico dos direitos naturais tal como ele foi aplicado às teorias da escravização e subalternização dos etíopes pela teologia moral católica, entendida aqui como um saber incontornável para a definição do vocabulário político do justo e da justiça nas sociedades coloniais, em particular, na América portuguesa. O curso está dividido em três módulos, a saber: “I – Método e problema de análise”, “II – Uma questão “global” para o século XVII: direitos naturais e cristianização dos africanos”, “III – Ilustração, escravidão e as reformas modernizantes”.
BIBLIOGRAFIA
ANDRÉS-GALLEGO, José; AÑOVEROS, Jesús María García. La Iglesia y la Esclavitud de los Negros. Pamplona: EUNSA, 2002. CABRAL, Gustavo César Machado. Ius commune: uma introdução à história do direito comum do Medievo à Idade Moderna. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. CALAFATE, Pedro. História do Pensamento Filosófico Português. Lisboa: Editorial Caminho,2007. Vols. II e III. _______. (Org.). A escola ibérica da paz nas universidades de Coimbra e Évora (séculos XVI e XVII). Coimbra: Almedina, 2015, 3 vols. DAVIS, Brion David. O problema da escravidão na cultura ocidental. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001 [1966]. DUVE, Thomas, José Luis Egío, e Christiane Birr, orgs. The School of Salamanca: a case of global knowledge production. Max Planck studies in global legal history of the Iberian worlds. Leiden; Boston: Brill | Nijhoff, 2021. HESPANHA, António Manuel. Porque é que existe e em que é que consiste um direito colonial brasileiro. Quaderni Fiorentini, v. 35, 2006b, p. 59-81. _______. Imbecilitas – as bem-aventuranças da inferioridade nas sociedades de Antigo Regime. São Paulo: Annablume, 2010. _______. Como os juristas viam o mundo – 1550-1750: direitos, estados, pessoas, coisas, contratos, ações e crimes. Lisboa: Amazon Distribution GmbH, 2015. HAAKONSSEN, Knud. Natural law and moral philosophy – From Grotius to the Scottish Enlightenment. Cambridge: Cambridge University Press, 1996. HÖPFL, Harro. Jesuit political thought – The Society of Jesus and the State, c. 1540–1630. Cambridge: Cambridge University Press, 2004. JORATI, Julia. Slavery and Race – Philosophical Debates in the Sixteenth and Seventeenth Centuries. New York, NY: Oxford University Press, 2024. _______. Slavery and race – Philosophical debates in the Eighteenth century. New York, NY: Oxford University Press, 2024. KOSELLECK, Reinhart. Histórias de conceitos – estudos sobre a semântica e a pragmática da linguagem política e social. Rio de Janeiro: Contraponto, 2020. KOSKENNIEMI, Martti. To the Uttermost Parts of the Earth: Legal Imagination and International Power 1300-1870. Cambridge: Cambridge University Press, 2021. LARA, Silvia. Palmares & Cucaú – o aprendizado da dominação. São Paulo: Edusp, 2021. MARCOCCI, Giuseppe. A consciência de um império: Portugal e o seu mundo, sécs. XV-XVII. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012. _______. “Conscience and Empire: Politics and Moral Theology in the Early Modern Portuguese World.” Journal of Early Modern History, vol. 18, no. 5, 2014, pp. 473–494. DOI: 10.1163/15700658- 12342426. MARQUESE, Rafael de Bivar. Feitores do corpo, missionários da mente: senhores, letrados e o controle dos escravos nas Américas, 1660-1860. São Paulo: Cia das Letras, 2004. PAGDEN, Anthony. La caída del hombre natural – El indio americano y los orígenes de la etnología comparativa. Madrid: Alianza Editorial, 1988[1982]. PÉCORA, Alcir. Teatro do Sacramento – a unidade teológico-retórico-política dos Sermões de Antonio Vieira. São Paulo: Cia das Letras. 1994. PRODI, Paolo. Uma história da justiça: do pluralismo dos tribunais ao dualismo moderno entre a consciência e o direito. São Paulo: Martins Fontes, 2005. PROSPERI, Adriano. Tribunais da consciência – inquisidores, confessores, missionários. São Paulo: Edusp, 2013 [1996]. RUIZ, Rafael. O sal da consciência – probabilismo e justiça no mundo ibérico. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência “Raimundo Lúlio”, 2015. SKINNER, Quentin. Visões da política – sobre os métodos históricos. Lisboa: Difel, 2002. SCATTOLA, Merio. Teologia política. Lisboa: Edições 70, 2009 [2007]. SCHNEEWIND, Jerome B. A invenção da autonomia – uma história da filosofia moral moderna. São Leopoldo: Unisinos, 2005[1998]. SOSA MAYOR, Igor. El esclavo en la teología moral católica, 1550-1570 In: AMRÁN, Rica; CORTIJO, Antonio (Eds). Minorías en la España medieval y moderna: (s. XV-XVII). Santa Barbara: Publications of eHumanista, 20162016, p. 210-229. THORNTON, John. A África e os africanos na formação do mundo atlântico, 1400-1800. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. TIERNEY, Brian. Medieval Poor Law – a sketch of canonical theory and its application in England. Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 1959. TIERNEY, Brian. “Aristotle and the American Indians – again: two critical discussions”. Cristianesimo nella storia 12, 1990, p. 295–322. _______. The Idea of Natural Rights: Studies on Natural Rights, Natural Law, and Church Law, 1150- 1625. Cambridge: Scholars Press, 1997. TOSI, Giuseppe. Aristóteles e o Novo Mundo: a controvérsia sobre a conquista da América (1510- 1573). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2021 WHATMORE, Richard. What is intellectual history. Cambridge: Polity, 2016. ZERON, Carlos Alberto de Moura Ribeiro. Linha de fé: A Companhia de Jesus e a escravidão no processo de formação da sociedade colonial (Brasil, séculos XVI e XVII). São Paulo: Edusp, 2011a. _______. “O governo dos escravos nas Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia e na legislação portuguesa: separação e complementaridade entre pecado e delito”. In: FEITLER, Bruno & SOUZA, Evergton Sales (org.). A Igreja no Brasil: normas e práticas durante a vigência das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia. São Paulo: Editora Unifesp, 2011b, p. 323-354. Avaliação  Participação em sala de aula;  Produção de um artigo.


VOLTAR